Melhor é confiar e se entregar.


Ao longo de séculos a gente vem desenvolvendo uma consciência de si, que nos possibilitou nos distinguirmos uns dos outros, nos apartando do coletivo e nos diferenciando da natureza. Como se fosse possível sermos outra coisa que não natureza.
Nos individualizamos a ponto de nos acharmos auto-suficientes, capazes de apreender a grandiosidade do todo e manipulá-lo conforme nossos interesses particulares. Todos os dias, porém, somos testados pela vida que nos confronta com sua impermanência, nos surpreendendo com as situações em que nos coloca e nas quais nos vemos com pouca ou quase nenhuma autonomia, e mesmo assim teimamos em acreditar que somos superiores.

Você é sim pura potência. Milagres podem sim acontecer, soluções que se dão sem que você tivesse tido condições de esquematizá-las. Mas relaxa, o que sua consciência decodifica, e que compõem aquilo que você chama de “você + o resto”, é quase nada. O andamento e a iminência dos fenômenos se dão independentemente de você, ainda que com a sua participação.

Essa coemergência é puro mistério, e é lindo demais. É poderoso demais, diante disso somos um lapso. E constatar isso não me aterroriza, ao contrário, me tranquiliza saber que no geral tudo se encaminha da forma mais adequada, muito além da minha capacidade imaginativa e propositiva, prosperando sempre. Sempre da forma mais conveniente para o todo, para a natureza, sua continuidade. Se permaneceremos, nós indivíduos, essa subjetividade que se atualiza sempre que necessário na expectativa de prosseguir, isso só vamos sabendo no decorrer da trajetória. C’est la vie.
A gente quer viver e viver bem, claro. A gente faz tudo o que pode, quase sempre, que é o que nos resta. Mais que isso, é entregar. Aquele mantra “entrego, confio, aceito e agradeço”, pois bem, entoar diariamente, na esperança de se convencer de uma vez por todas da nossa pequenez e quem sabe assim, um dia, expandirmos.