Dançar a vida.
A gente muda todo dia mas alguns acontecimentos nos transformam mais intensamente. O corpo traz evidências claras do como se dá nosso processo de amadurecimento. Ele não só deixa transparecer, ele é o testemunho vivo da trajetória daquele ser. Você é seu corpo, também.
Tenho 35 anos de história, e um câncer na bagagem, além de outras vivências múltiplas. Eu definitivamente andei mudando muito. Eu danço desde que nasci, mesmo. Mas não danço mais como dançava aos 10, aos 20, aos 30. Existem demandas diferentes, contudo não sinto que é melhor nem pior, mas é a dança de uma mulher de 35 que já viveu um monte de experiências muito significativas. Me orgulho do que me constitui.
É por isso que, apesar das limitações que surgem e ainda surgirão, eu me sinto cada vez mais livre (e linda) dançando. Por que minha dança traz cada vez mais presente a verdade de quem dança não para ser admirada, mas por que precisa disso para sobreviver, significar, e se sente cultuando a vida que a anima, quando dançando. E, assim, dança uma dança que liberta, dá sentido, não necessariamente performática. Por que não sei até quando poderei estar eventualmente nos palcos, mas cada vez isso importa menos. Os códigos, as técnicas, isso tudo é incrível mas eu os reinvento se achar conveniente, tipo uma licença poética, tudo em prol da minha satisfação e da dança que emerge genuinamente daqui. O que importa mais, hoje, não é o como meu corpo se expressa, mas o que o move. Quero crer que independo da minha mobilidade, flexibilidade ou habilidades específicas para dançar, quero dançar até mesmo quando meu corpo-mente estiver inerte. Respirar dançando, caminhar dançando, dormir dançando, sorrir dançando, pensar dançando, amar dançando.
Mas eu ainda estou ativa e há tanta vida pulsando que eu quero me desafiar. Se eu não deixei de dançar, mesmo imobilizada por conta da mastectomia e das cirurgias de reparação que fiz, não ia ser agora, já restabelecida.
Voltar após 8 anos a estar junto da companhia de dança da qual fiz parte por outros 8 é especial. Outra Marina, outra cia, outro momento, porém uma paixão que permanece. Fui acolhida com ♡, sou uma bailarina privilegiada.